As coisas que nunca disse

Em tempos em que sigo profundamente apaixonada pela vida mas por ninguém em particular, Mia Couto tem a capacidade de me fazer suspirar encantada nas leituras que desenham vida nas palavras, que inventam significados nunca antes pensados, que casam sentidos que dão novos sentidos. Custa-me parar de o ler. Como menininha enamorada, volto à leitura sempre com a certeza de que o meu mundo ficará mais bonito no fim de cada página. Fala de tudo e de coisa nenhuma e, quase sem contar, aparecem frases como esta, que nos devolvem explicações de coisas que nunca nem tínhamos tentado perceber:
"Ele há dessas coisas tão subtis, incapazes mesmo de existir.
Como essas estrelas que chegam até nós mesmo depois de terem morrido."
E fico a pensar nas estrelas. Essas explosões imensas de luz que, de tanto se demorarem na viagem dos céus, não podem nunca retribuir os olhares de contemplação.
Às vezes temos mania de estrela, sensação de eternidade, e adiámos numa viagem imaginada esse brilho que vive em nós, porque não sabemos se outras luzes o irão fazer passar despercebido, ignorado, e é mais fácil guardá-lo protegido de olhares que não o nosso. E é um brilho que não brilha. Escondido na sua vergonha, no medo de não ter o que iluminar.
Há coisas que não existem porque não são ditas, não são partilhadas, e é então como se elas nem nunca existissem. Mas delas sempre fica um brilho disfarçado. Uma intensidade densa de sentir guardada no silêncio do coração.

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