Entre casas

Ontem saí de Casa. Hoje cheguei a casa. 
Esta última tem letra minúscula, mas é já grande em mim.

Depois de quase dois meses em Portugal preenchidos de pessoas e aconchegos, regressar à Guiné-Bissau traz aquele desconforto de uma dor que não sei bem identificar, daquelas que não matam mas moem. E distraída que vinha nessa espécie de mal-estar, fui surpreendida pelo meu coração que saltou contente ao aterrar em Bissau. 
Logo a descer as escadas do avião, o calor húmido envolveu-me e colou-me a esta terra, como que em jeito de acolhimento, quase que a lembrar-me que também lhe pertenço. Suspirei e sorri sozinha. Tinha-me esquecido que sou feliz por aqui. Tinha-me esquecido - no meio da confusão das despedidas - das pessoas que ia (re)encontrar por cá. Tinha-me esquecido, naquela ingratidão de quem vê os seus desejos atendidos, que este trabalho e esta vivência são o meu sonho. 
E é incrível, e até paradoxal, como neste país de eterna instabilidade política e militar, a primeira coisa que sinto com uma força extasiante mas serena, é a mais firme sensação de paz. 
Paz. Foi em paz que me senti enquanto caminhava os primeiros metros nesta terra. E seguia de sorriso no rosto, confusa pelo regresso tão sofrido e, afinal, tão arrebatador.
Continuei a suspirar e a tentar equilibrar em mim esse entusiasmo da chegada com a angústia da distância que já se fazia sentir.
Ainda estou a reaprender a respirar. Literal e metafóricamente. Depois de oito semanas fora, demora até que os pulmões se adaptem à humidade que bebem. Depois de oito semanas fora, demora até que o coração fique leve e se passeie nessa ponte entre a Guiné-Bissau e Portugal.

Suspiro mais uma vez e confio à noite esta dualidade de sentires. Demoro-me nesta alegria boa que não sei explicar. Descanso o longe nesse espaço sagrado em mim.

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