Fazer as malas

















Pois é... há coisas que não cabem nas malas. 

Estou desde ontem a enfiar coisas dentro das duas malas que me vão acompanhar até Casa, e agora, quase prontas, continuam vazias. Não de espaço, que esse está bem aproveitado. As minhas malas vão vazias do que realmente importa; vão vazias dos sentidos e das aprendizagens, vazias das mil eternidades tocadas, dos instantes em que o céu era mais perto. As minhas malas vão vazias do meu coração a explodir, das lágrimas dos meus olhos, da saudade do que ainda não passou. As minhas malas vão vazias das cores, do peso da terra, da chuva a molhar a pele, dos relâmpagos a incandescerem a alma. As minhas malas vão vazias do corpo sentado no chão, das estradas que cortam os matos, das estrelas a queimar no céu. As minhas malas vão vazias de conversas intermináveis, de gargalhadas patetas, de companheirismo, de entrega, de fascínio.
Nada nestas minhas malas... nem uma só descoberta no bolso lateral, nem um sorriso escondido debaixo duma camisola, nem mãos abraçadas em cumplicidade dentro das meias. Nada. Só roupa, acessórios, livros antigos, sandálias. Como podem estas malas tão pesadas não terem nada interessante lá dentro?
E este vazio das malas rasga em mim o corpo de sentires, nessa responsabilidade gigante de guardar tudo, de não esquecer nada.
Se as minhas malas se extraviarem no caminho, a TAP tratará de me restituir os bens perdidos. Mas e isso tudo que levo dentro de mim? Quem se responsabiliza? A quem vou reclamar se perder momentos, imagens, significados?
Devíamos poder fazer um seguro da nossa memória.

1 comentário:

  1. O teu coração está repleto. Repleto dessas memórias, imagens, sentidos, tudo o que vivenciaste e que não conseguirás esquecer nunca! Por mais tempo que passe e apesar de as poderes "arrumar numa gaveta" quando menos esperares elas estarão de volta, vai ser só "abrir a gaveta". "Que o teu coração albergue todas as tuas vidas". Pode parecer difícil mas estará tudo lá. Confia...
    Mami

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