Surpresa de amor

Ela estava de saída. Ele veio para ficar. 
Doce ironia, irrecusável entrega.

"Quando menos esperares...", diziam. Cliché dos clichés, não é que foi mesmo assim?

E ela aprendeu a beijar sorrisos que não se fechavam. Aprendeu que os corpos podem ser mais do que o prazer, nesse sagrado sublime, espécie de ascese inconsciente. Aprendeu a ler os abraços e os suspiros que falam no silêncio denso de sentidos. Aprendeu o segredo do que se sente e as palavras não dizem, e aprendeu que quando as palavras o dizem, o sentir fica maior que o mundo, como que libertado pelo verbo. 

E assim, sem contar, nesse céu de estrelas cadentes, choviam sagrados e eternidades. Ele distraído, via apenas as luzes brilhantes. Ela corria a apanhar os pedaços dessa magia, a guardar no bolso esses bocadinhos de um divino tocado. Ah, sem exagero. Mas onde se concretizará o divino senão nesse recíproco desejo de alguém? 

Pois, mas é bom não nos envolvermos nesta história, porque ela estava de saída. Já tinha comprado o bilhete. E foi. Viagem demorada, que começou antes do início e continua mesmo depois do fim. 
Parece que toda esta história é apenas essa viagem. A sua preparação, a sua conclusão. 
E não é a vida uma viagem? 
Não é o amor uma viagem ao outro? E que viagem! Não vem no mapa esse destino, não há coordenadas GPS, esquerda ou direita. Apenas uma total desorientação boa de sentir. Uma entrega a esse caminho desconhecido e sempre novo, sempre surpreendente.

Foi uma surpresa. Ninguém estava a contar. Ela já nem sabia amar. Ou não sabia que sabia. Ou não sabia que podia. Foi uma surpresa.
Ainda é.
Às vezes, lá dentro da saudade, ainda fala mais alto essa surpresa de amor. 




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