Sombra di mamé

O Barra Siga é motorista na FEC. Mas mais do que nos levar pelos caminhos da Guiné-Bissau, conduz-nos muitas vezes por histórias e tradições, metáforas e provérbios desta terra e deste povo. E, às vezes, é também um pouco médico e acerta, quase certeiro, nas maleitas que nos atrapalham por aqui.
Ontem uma febre, a terceira de toda uma existência de 29 anos, levou-me até Bissau. Bem, na verdade, quem me levou foi o Barra. A mim e à Sandra, que também estava doente. Dizia-nos que os brancos ficam doentes mais facilmente, que não nos acostumamos à temperatura e às comidas, que a nossa pele é mais fraca. Mas que, se falarmos bem crioulo, já não ficámos doentes, porque a Guiné já nos conhece.
- A falar como estás a falar, já não vais ficar mais doente, Momi. - dizia-me.
E eu, a brincar, respondia-lhe que isto era só mimo, que estava com saudades de casa e já a contar os dias para as férias. Pois ele respondeu-me, convicto:
- Corpo disdja tera! Si i na bai djubi si tera, i na bim más mindjor!
(O corpo tem saudades da terra. Se vai visitar a sua terra, depois já volta melhor.)
 
- Que bonito, Barra!, disse-lhe, emocionada. E confessei-me já perdida de saudades de casa e dos meus.
 
Hoje, já absolutamente restabelecida e a trabalhar em Bafatá, explicou-me que só ir a Bissau me fez bem. Segundo ele, Bissau foi a primeira cidade que me viu quando cheguei à Guiné. Então, em Bissau estou mais perto de casa e o meu corpo também.
E continuou:
- Sabes, o corpo precisa da alma. E a alma está em casa. As casas não são só o branco ou o cinzento das paredes, também são a nossa alma. E quando o corpo está tanto tempo longe, começa a sentir falta da alma. É só chegar a casa, que fica logo bem.
Sombra di mamé i ta djudau.
(A sombra da mãe ajuda-te.)
 
Tão bonito este dizer: só a sombra da mãe já ajuda.
E não duvido. Estar perto das pessoas que mais amamos, das pessoas que mais nos amam tem, certamente, um poder inexplicável. Ou então muito simples de explicar, como fez o Barra.

É mesmo isso que eu preciso: a sombra da mãe, a sombra do pai, a sombra dos irmãos, dos avós... Preciso das sombras da família e dos amigos.

O que eu queria mesmo era esta coisa impossível de conciliar o inconciliável, de todos os lugares serem um só. Pois ainda que o sejam dentro de mim, cá fora há distâncias que o tempo aprofunda e intensifica. E eu, sendo esses lugares repartidos, vou esticando até doer um bocadinho. Agora, não o corpo (que esse está mais que saudável) mas o coração, precisa sim dessa presença que cura, dessas pessoas que basta estarem perto para nos encherem de vida, de luz.
O coração precisa dessa sombra de amor.

12 comentários:

  1. Meu Deus.....como és especial.


    Sofia

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  2. Olá mana!
    Que coisa tão simples, tão linda e tão sábia ... "A casa" sente tb tanta falta de ti pq tu és a alma dela! Estamos ansiosos por te abraçar :-)!

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  3. Sabedoria tradicional... e só quem for tolo não lhe dá o devido mérito. O que sabemos nós? Vemos tudo pela luz da ciência e do materialismo mas há coisas que não se explicam cientificamente.
    Respeitemos todos os povos, todas as crenças e estaremos a respeitar o ser humano.
    E a "sombra" está á tua espera.
    Beijo grande.
    Mami

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  4. Estamos juntas querida Momi. Aguenta coração, todos os dias estás a caminho da Alma. Beijo grande e um abraço bem maior!* MJoni ;)

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  5. Abraço demorado, minha querida! Saudades taaaaantas*

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  6. Sempre que leio o teu blog encontro uma resposta.

    Obrigada.

    És uma menina abençoada Momi.

    Bjinho muito grande e bom regresso às tuas sombras :)

    Marisa

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  7. A tua mente transborda sabedoria.... O teu coração transborda de AMOR!

    Só hoje percebi quanto a minha sombra te pode reconfortar.

    A nossa sombra está á tua espera.

    Beijo Grande.

    Papi

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    1. E já só faltam 29 dias :)
      Abraço demorado, papi*
      Amo-te muito!

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